A Câmara Municipal de Mogi das Cruzes realizou uma sessão solene, na noite desta sexta-feira (19), para entregar a Medalha Zumbi dos Palmares a personalidades que se destacaram em ações contra a discriminação racial, na defesa dos princípios constitucionais e na promoção da inclusão social. A solenidade acontece anualmente e, neste ano foram homenageados Leandro Odilon de Brito, Jamile Santana, Sidnei Barreto Nogueira, Ilda Alexandre de Azevedo de Souza, Afrontarte - Associação Afro-Brasileira de Cultura e Arte, Vanda Cristina de Souza Lopes, William Aparecido Corrêa de Salles, Gislaine Donizete Afonso, Wellington Miranda da Silva e Maria Benedita Simão.
“Infelizmente o Brasil não é o país da democracia racial e isso é muito fácil verificar. Quem morreu asfixiado na porta do Carrefour foi um negro, quem teve que tirar as roupas, suspeito de roubo, foi um negro, quem levou oitenta tiros foi um músico negro. Se os acessos fossem igualitários Mogi das Cruzes, por exemplo, já teria tido um prefeito negro e a a maioria dos juízes e generais não seriam brancos”, ressaltou o vereador Iduigues Martins (PT), que presidiu a solenidade.
Emocionada, a secretária municipal de Cultura, Kelen Chacon, representando a Prefeitura, enalteceu a contribuição da ancestralidade negra para a sociedade brasileira e fez questão de lembrar a trajetória da professora e militante Mari Mendes, que faleceu neste mês de novembro por conta de um mal súbito. Mari Mendes é reconhecida pela contribuição às causas sociais, sobretudo na luta antirracista no município de Mogi das Cruzes. “Uma mulher brilhante, forte e de ensinamentos, de explosão de alegrias. Uma mulher de uma trajetória incrível na educação e na luta estudantil”.
A jornalista Jamile Santana, homenageada, reconheceu a importância da Medalha Zumbi dos Palmares, mas afirmou que ainda há muito espaço para avanços no combate ao racismo. Jamile fez uma crítica à bandeira do município, criada pela Lei 804/1956, que determina uma fatia preta menor do que a branca, porque, de acordo com a lei, os negros tiveram uma contribuição menor no desenvolvimento da cidade. “Mogi das Cruzes é um município que historicamente, de forma documentada, não reconhece a contribuição do povo negro para a sua história, para o seu desenvolvimento. Essa cidade foi construída com sangue, luta, infância e dedicação do povo negro. Hoje temos aqui dez homenageados, mas somos muitos. Então, eu acredito que hoje, quando celebramos a Consciência Negra e essas contribuições, estamos fazendo um reparo histórico, mas só isso não é suficiente”, ressaltou.
Também homenageado, Leandro Odilon, reforçou a importância do combate ao racismo no Brasil. “Não adianta a gente afirmar que não somos racistas, temos que afirmar que somos antirracistas. O antirracismo certamente é a ferramenta de mutação desse status quo que somos submetidos diariamente”, argumentou.
A homenageada Vanda Cristina falou sobre o preconceito contra os negros, que acontece desde a infância. “Vocês têm que se levantar, entrar internamente dentro de vocês, e pegar todo esse preconceito para se tornarem grandes. Pegar todas as ofensas e montar diante de vocês uma grande muralha, foi assim que fiz a vida inteira”, afirmou.
A vereadora Inês Paz (PSOL) usou a tribuna para falar sobre a importância do combate ao racismo. “É preciso sempre a gente lembrar e ter consciência que o combate ao racismo estrutural é uma batalha do dia a dia, de todos e de todas”, ressaltou.
“Na última sessão ordinária aprovamos o feriado da Consciência Negra na cidade. Infelizmente muitos não entenderam que esse feriado não é o dia do ócio, mas o dia de nós refletirmos qual é o nosso papel dentro desse racismo estrutural que vivemos em nosso país por tanto tempo”, acrescentou o vereador Zé Luiz (PSDB).
O vereador Juliano Botelho (PSB) falou sobre a importância de Zumbi dos Palmares na luta pela libertação do povo negro. “Nós não recebemos um convite para vir para o nosso país, nossos descendentes vieram presos e aqui estamos hoje, devido à escravidão, que perdurou por trezentos anos. E a história de luta se estendeu na figura de Zumbi dos Palmares, para que tenhamos a nossa liberdade”.
Edinho do Salão (MDB) homenageou Zumbi dos Palmares recitando a letra da música “Zumbi”, do grupo Sensação. “Somos filhos de uma mesma cor, mesmo sangue, mesma dor, com espírito de guerra e luz, fogo, ferro e cruz. Muitas vezes eu na pele senti. Temos um caminho a seguir, liberdade para viver é Zumbi, para sonhar e ser feliz”.
Também estiveram presentes na solenidade o vereador policial Maurino (PODE), que secretariou os trabalhos da sessão, e do vereador Edson Santos (PSD), a secretária municipal de Assistência Social, Celeste Gomes, a advogada Janes Kelly Palmeira Rodrigues, que representou a 17ª Subseção da OAB de Mogi das Cruzes, o presidente da Associação Axé Mogi, Pai Roberto de Xangô, a diretora adjunta da Associação Comercial de Mogi das Cruzes, Ada Cristina, do ouvidor do município de Suzano, Sadao Sakai, e do pai Danilo de Oxalá, representando o Centro Cultural Axé. A homenagem também contou com a apresentação artística do Grupo Afrontarte, dirigido por Lord Júnior, com o número “Vozes da Resistência”.
Zumbi foi um dos líderes do Quilombo dos Palmares, o mais conhecido núcleo de resistência negra à escravidão no Brasil - morto em 20 de novembro de 1695 em uma emboscada na Serra Dois Irmãos, no Estado de Pernambuco -, resistência que culminou com a libertação dos escravos, concretizada em 13 de maio de 1888. Desta forma, Zumbi dos Palmares tornou-se líder e exemplo de resistência à escravidão, sendo que na data de sua morte, 20 de novembro, comemora-se o “Dia da Consciência Negra”, com a realização de eventos de cunho cívico e cultural, de conscientização comunitária contra ações de discriminação racial e de inclusão social sem preconceito.